25.1.18
ESSEPÊ, poema recauchutado em homenagem à cidade de São Paulo
Vale a pena ver de novo?- Ilustração para um cometimento poético deste que vos fala, intitulado Essepê ( na comemoração do aniversário da cidade na qual nasci em meados do século passado).
É bom salientar que esse cometimento foi publicado aqui neste blog, antes do talentoso compositor Criolo fazer o tremendo sucesso com sua magnífica música que se chama "Não existe amor em Essepê".
Essepê como se pode ver apesar de sua "concretude", "concretiticade" sempre esteve no ar. Ideia que pertence a todos e a ninguém.
Lá vai o cometimento poético (prepare-se que vai ser textão. Apenas uma observação inicial: esse cometimento errático revisitado, agora foi recauchutado. Pois é, a cada ano novos elementos a ele são acrescentados ou destruídos, assim como acontece com a cidade que homenageia )
ESSEPÊ
São Paulo, cidade de
São Paulo, essepê
Esse pé quarentão que dói no fim do dia/
depois de milhares de semáforos em transe...
Primeira geração digital e pré-história se amando na 23 de maio engarrafadas/ entre muros acinzentados "prefeitamente"
Doentes de seu tempo
Cemitério do Araçá guarda meus mortos, benza Deus!
Cidade, metrópole, megalópole,
Abrigo e túmulo de migrantes polifônicos
Mistura terminal e casa modernista/
Presídio que vira praça
Praça que vira presídio...
Paradoxos ambulantes, anacrônicos xerocados. Homens-sanduíche gritam:- Compro ouro!
Massas e Iphones, café expresso na galeria Olido
Avenida Paulista, rolex que brilha sob a chuva ácida
E atrai o olho do gatuno
Cine Vera virou casa de forró, mano!
Talvez hoje nem isso
Mendigos embaixo do viaduto celebram com CO² o sucesso do novo plano urbanístico
Miséria high tech?
Luz, Tiradentes... Onde andará a menina linda da avenida Água Fria?
Cidade mãe com nome de santo – cidade travesti ou...
Medéia ensandecida que mata seus filhos com hamburgers
Aristocracia de mais de 450 anos em banheiras J'Accuse!
Zola nunca te imaginaria assim tão germinal
Burguesia de Caras maquiadas, sorry dentes no programa de TV
Periferia que almeja, deseja,
Fossa séptica ao ar livre, poço artesiano onde falta cano,
Sonho do precariado indo pro brejo eletrônico
Well then what can a poor boy do
Except to sing for a rock 'n' roll band
Serra da Cantareira, Horto Florestal, domingueira subalterna
Operário dormindo no vagão, 19 horas em ponto/
Pichação no monumento das Bandeiras: – Empurra que vai!
Movimento CON CRE TO / OB SO LET'S GO
Reconhecimento de gêmeos grafiteiros globalizados
London Calling... motoboys em ação, zig-zag... movimento abstrato desenha o nada consta no poupatempo
Cada um por sí e Deus contra!
Cadê o chá das 5 do Mappin?
e a Barão de ItaTapeteNinja? – Quero um calçado de cromo alemão! E um terno da Erontex, num vai?
Uma anta no vale do Anhangabaú pergunta por Macunaíma...
– Cadê o coração dos outros?
No Cinema da boca do lixo, o Bandido da luz vermelha come um churrasco grego/ É O grande momento de São Paulo S.A
Onde antigamente tinha erva-mate e hoje corre um rio sufocado que passa
pelo Buraco do Adhemar!
Viaduto Santa Efigênia dourado? São Bento corado? Angelus e o sino tocando. O papa benze benhê, a Virgem levita. Bora pro curso noturno. Num dorme não rapaz!
Meio dia, macacada! Uma hora para o almoço, cartão de ponto... se chega atrasado o relógio do seu Dimas desconta seu ponto, no holerite vem o desconto
Mário, arrebenta tua lira! Arlequinal, arlequinal... escarra no Minhocão tua última quimera
Desvia as águas espraiadas para o Tietê, marginal!
Paca, tatu, cotia não... Paca, tatu, cotia não!
Contempla as pontes estaiadas às dúzias
Perderam o corpo do meu nonno Gaetano na revolução de 32!
Punks e Emos fora de lugar, Tarsila cadê meu "Estadão"?
Tá com o Lobato lá no Sítio!
Estatuto do coração, Raízes do Brasil, Rua Cuba, anime, mangá
– Mano me dá uma mano, che!
Bolivianos costuram o bom e o mau retiro
Guevara se perdeu na mata hermano, ahora ninguém é de ninguém na vida todo passa
Orientais ali habitaram – gentrificaram. A verdade está lá fora
O Torá, onde está, amici miei?...
Lá sei eu! Eu não sou daqui, marinheiro só, tô de passagem "brimo"
Espanca o cara meus! Mói os ossos do tapuia , depois joga no Museu do Ipiranga,
Muita higiene social
Proclama a independência! /
Faz uma tatuagem
E o perito que não chega!
Arigatô, Sharihotsu!
Cidade provisória, casas de pedra só em Santos!
Tudo a ver na Sloper, Dalsu, Fashion Week, Bienal, Vão Central Anhembi, Galerias, Shopping Centers/
Rua Alasca? Ê lasquera!
– Nada vejo, a não ser a neblina, vou bater o côco...
Crack!
Boa Vista, Largo São Francisco, Ladeira da Memória
Cidade fantasmagórica, lume móbile na cracolândia
Teatro Municipal leva aquela ópera que você gosta, oh Core 'ngrato! Que barafunda na Barra Funda!
O tenor canta a soprano...o rei da vela pede smoke
Arquitetura em delírio tropical...Copam e Morumbi,
FAU, Masp, cadeiras de Lina Bo na fábrica da Pompeia
Ladrões de Picasso e Portinari correm para o Embu, afinal é das Artes
E eu com isso, Embu Guaçú!?
Pizzas e sábados todos iguais... Padaria cheia com roleta russa
Casa Verde , Mandaqui, manda ali... Mercadão, mortadela!
Me dá um bauru, mas sem picles!
E aqueles ojos verdes? Eu os comeria "a vinagrete".
Chaminé sozinha em Santana observa um templo sectário
Que mais parece um hangar interplanetário
fiéis às pencas desfilam suas crenças
Enquanto padre en-canta na TV
Mooca imortal do "moleque travesso", rua dos Italianos...
Vila Galvão, Trem das Onze/ Arnesto nos convidou prum samba, ele mora no Brás/
Nóis fumo e não encontremo ninguém...
O Bexiga canta numa cantina aquela cançoneta Funiculi Funicula
Pão quentinho, inigualável, macarronada da mamma
Homenagem aos mortos do massacre da Armênia ao lado do Tamanduá-teí
Baladas, xavecos, playboys, hiphop...
Garotas programadas na Augusta exageram os corpos por baixo do cetim e o movimento perpétuo dos seus lambris convidam o solitário para uma aventura paga em dólares
Na Aurora, sonolentas mariposas sacodem suas asas na luz vermelha dos inferninhos,
Eu as vi de manhã, bolsinhas no ombro, olheiras de uma longa noite e eu a caminho do meu longo dia
– Manda um "Fogo Paulista" goela abaixo e esquece...
Meu pai remando no Tietê. Sai daí, ô véio!
Na Ponte das Bandeiras nós vamos pegar um peixe!
Me paga um rabo-de-galo?
Um fantasma exibicionista abre o casaco em frente ao Dante, melhor seria no Belas Artes
Nos subterrâneos da Consolação o Primo Basílio conversa com Elias Canetti , noutro lado da rua no Riviera, o desbunde come solto
Enquanto na Baixada do Glicério, no Paulistano da Glória homens negros elegantes esquentam os tamborins, Vinicius se engana redonda-mente - o samba ainda pulsa
Liberdade e Paraíso viraram estações, meu Deus, onde está a Sé nisso tudo?
Marco Zero da civilização! Capital monopolista, pirâmide da indústria, topo panóptico da América Latina!
Borba Gato tá se achando!
Cidade sem outdoors... tem cimento no meu capuccino!
Helicópteros levam a nova classe
por cima dos edifícios e antenas
captam o som da nova era: Não é o Som de Cristal. – Esse "já era!" – Qual a cotação da Bolsa de Valores, Mr. J R ? Te liga no Mercado Futuro, tá ligado?
Ruído... – Desce um Pignatari!...Com gelo ou caubói?
– Me serve um "Baião de dois"!...
Artigo do professor da USP explica o nacional-popular
A Gazeta é esportiva... escadarias/ Cásper Líbero
Ao fundo ouço um gol... – Foi do Curintia ou do Parmera?... – Foi do Sumpaulo?
– Não, foi do Juventus... da rua Bariri. Você se alembra? É rua Javari, seu stronzo!
A mardita pinga que me atrapaia/
Veloz passa a noite e um novo sol nascerá violeta
não atrás de uma nuvem cigana,
Milhões de carros como gafanhotos virão para o apocalipse diário do ABC
E novos baianos te curtirão numa boa/
Na Vila Madalena...
...A espanhola perdeu o gato, seo Rubinato!
Praça da Res-púbica abrigava patinhos
Ma che cazzo de mania essa de pato, bambini?
A do Patriarca é dos patrões... fascismus architetonicus no Anhanga-baú da felicidade
Cavo e no fundo do quintal, acho um cachorro morto,
É um lobo? Não pazzo, seu pai enterrou o pobre e jogou no bicho/
E esse livro do Engels embaixo das tábuas do assoalho? Isso é conto da carochinha...Vire a página! – Quem hoje quer saber a história da Família e da Propriedade Privada? Sem essa...
Esqueci de chorar nos ladrilhos da rua Barão de Limeira
Lá passei minha adolescência. Quando fiz 18 anos me mandei pra São Miguel Paulista...
Fui ser químico, zio Vincenzino... encher de mata-baratas latas de aerosol. Mas isso foi em Santo Amaro... fazia um frrrrio!!! Como tem santo nessa terra de Piratininga!
– Matou alguma barata figlio mio? – Necas, mas nunca mais peguei pulga. Kafka aqui não ia se dar bem. – Ciao bambino, ciao...
Onde é a saída, tiozinho?
– Pega a marginal Pinheiros e dobra à direita, sempre à direita...
– Me espere! Que um dia eu não volto, Voltolino!...
(Escrito em 31/5/2008 e reescrito em 2018)
Labels:
cidade de São Paulo,
cometimento poético,
Essepê,
Homenagem,
Ilustração,
texto
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário