1.11.07

Uma leitura política do Grande Sertão e muito mais


(Final do ensaio sobre o livro Grande Sertão: veredas)
Também é possível uma leitura política do Grande sertão, na qual se trata o discurso ideológico como risível: "Ao que Zé Bebelo elogiou
a lei, deu viva ao governo, para perto futuro prometeu muita coisa republicana. Depois enxeriu que eu falasse discurso também. Tive de
– você deve citar mais é meu nome – falar muito nacional – se me soprou". Ao que Riobaldo acrescenta: "O povo acho que apreciava".
As preocupações do autor são éticas. Oscar Lopes ilumina esta questão ao dizer que (Rosa reabre "edificado por mais de dois milênios e
meio de experiência histórica o problema que Ésquilo pensava ter resolvido na Oréstia. Lá a moral gentílica da vingança entre os clãs se
resolve absorvendo o último vingador, Orestes, instituindo o tribunal da cidade, passando as Fúrias ao serviço de uma nova forma de
vingança". No Grande sertão as coisas não são bem assim: "Nenhumas ilusões maniqueístas sobre o dualismo absoluto do bem e do
mal. O homem continua pacatário". Hermógenes, com toda sua fama de mau, representava uma maldade ingênua, diante de um
homem como Habão, que "não sabe olhar para outro homem sem o ver na qualidade de força trabalhadora anônima, reprodutora de
investimento". Um estranho Midas na visão do jagunço: "E ele cumpria sua sina, de reduzir tudo a conteúdo. Pudesse economizava até
com o sol e com a chuva". O "mal" só mudou de forma, agora é capital, um novo pacto. É o fim da jagunçagem heróica. Riobaldo range
os dentes: "Os jagunços destemidos arriscando a própria vida, que nós éramos; aquele seo Habão olhava feito jacaré no juncal: cobiçava
a gente para escravos".
O Grande sertão fica distante muitas léguas do maniqueísmo. Seu autor via, por exemplo, Jorge Amado como cativo da ilusão dos contos
de fada: "É uma criança que acredita sempre no bem e na vitória dos bons sobre os maus". Para Rosa, nada no mundo estava
"definido". O próprio Riobaldo torna-se proprietário. Seu rememorar é a busca de um sentido para tal passagem. A questão pendente é
ele não saber que continua pacatário. Seu mundo épico vive só nas páginas de um livro – este sim definitivo. "Nonada" de medo do seu
autor. Afinal só "existe homem humano". Travessia.
(Esta é uma versão modificada do artigo que fiz com o título As chaves do matagal indevassável, publicado em 1997 no Caderno B, do Jornal do Brasil numa edição dedicada à memória dos 30 anos
da morte do escritor).

4 comentários:

Anônimo disse...

Tudo poética bela imensa, o escrito sobre Rosa teu. a questão econômico-política no caso pra mim está no cercamento de campos em latifúndios para produção exportadora, como é ho-je, e aqui desde 1500, a terra produz para exportar. cansada de cana. zé

LIBERATI disse...

Caro Zé, fico contente que tenha gostado na minha prosa sobre sêo Rosa. Você tem razão, terra cansada de cana e de sacana também.
Espero que nosso guia mor do obreirismo não consiga emplacar essa história do etanol, aí é que a terra vai se esgotar. Fazer combustível para tocar aqueles carrões americanos, epa! Longe de nóis tal destino. Precisamos de outra via.Somo um país rico de terra, minerais (essa privatização da Vale que não consigo entender), tudo que se planta dá, parque industrial moderno. Falta educação, tecnologia (e até temos áreas onde somos muito desenvolvidos, vide Fiocruz e Incor e outros biológicos que criam coisas incríveis )Etanol?
Êta nóis!
Um abração, bom feriado

Léia Alves disse...

Parabenizo, pelo belo blog!! Belíssimo trabalho! Imagem incrível, merece maior divulgação...Sucesso!
abçs

LIBERATI disse...

Cara Léia, fico contente que você tenha gostado do meu blogue. Fui lá ver o seu e gostei, bonito, poético,vou visitar mais vezes. parabéns!