15.11.07

Pequenas homenagens a Norman Mailer


Enquanto não preparo uma boa homenagem ao grande Norman Mailer, vou publicar uns trechos de livros que ele escreveu que achei legais e onde ele mostra o seu talento no uso da ironia e o bom texto que o bom Deus não lhe deu e ele teve que conquistar catando milho nas "pretinhas" (que é como os velhos homens de imprensa chamavam as teclas da máquina de escrever- gíria de redação - rj) e os recursos literários que ele usa para dar um molho na massa de fatos que vai narrar. O trecho que escolhi hoje está no livro "Miami e o Cerco de Chicago- A História Informal das Convenções Republicana e Democrática de 1968" (Miami and the Siege of Chicago) que na verdade são textos que ele publicou na Harpper's Magazine, The New York Times, Village Voice e The Washington Post
"A menos que o conheçamos bem, ou tenhamos efetuado um considerável trabalho de preparação, é quase inútil entrevistar um político. Sua mente está habituada a perguntas políticas. Na altura em que decide candidatar-se à presidência, fatalmente, já terá respondido a um milhão delas. Ou, pelo menos, isso será verdade se estiver militando na política há vinte anos e tenha respondido a uma média de cento e cinqüenta perguntas por dia, uma previsão nada fora do possível. Surpreender um político hábil com uma pergunta será tão difícil quanto atingir um pugilista profissional com um "gancho" de briga de botequim. Portanto, não se pode contar grande coisa de entrevistas com um candidato. Seus dentes deverão estar brancos, suas maneiras brandas e agradáveis, sua presença atraente e a sua habilidade em contornar a pergunta e retornar com uma resposta está tão implícita no trabalho de suas mandíbulas quanto a de morder um pedaço de carne. Entrevistar um candidato é quase tão íntimo como pegá-lo na televisão. Portanto, às vezes, é mais fácil catar a verdade da sua campanha através do estudo das estruturas de sua atividade. Sendo assim, o reporter saiu para fazer a cobertura do elefante."
(O elefante que ele se refere, é um filhote de paquiderme que foi oferecido a Richard Nixon (O Candidato escolhido na Convenção de Miami em 1968) pela população de Anaheim, Califórnia e estava a bordo de um avião de carga que iria pousar no aeroporto daquela cidade "cubana"- segundo Mailer, esta "lhe pareceu a maneira mais apropriada para iniciar a cobertura da convenção". Na segunda parte do livro, em que ele trata da Convenção do Partido Democrata em Chicago, o nosso repórter na verdade blefou, e confessou isso no texto. Fugiu da verdadeira guerra campal que se explodiu na cidade preferida de Al Capone. Cobriu a pancadaria de longe, do alto de um prédio de 19 andares , numa das noites do quebra-pau ele confessou que preferiu ir a uma festa e passou lá no campo de batalha horas depois. Seus relatos do massacre são de outros jornalistas que cobriram "in loco" o ataque dos policiais aos manifestantes que se recusavam a abandonar um Parque. De qualquer forma, mesmo saindo pela tangente, ele fez um bom apanhado do que foram aqueles dias loucos, e sua análise e sacadas continuaram geniais. Nesse momento a gente vê que o velho repórter soube se esquivar do porrete e escapar do gás lacrimogêneo.) Noutro "post" eu vou selecionar algum trecho que fala dos Yippies e o folheto que foi distribuido no Lincoln Park em Chicago com o programa desse movimento . A exortação do folheto já é uma graça: "VOTE NUM PORCO EM 1968") Mais tarde, vou falar da biografia que ele fez de Marilyn, um outro blefe que ele sustentou com matérias dos outros- um defeito? Uma necessidade de ganhar dinheiro para pagar as várias pensões alimentícias, diziam os seus opositores? E esse negócio de se tratar na terceira pessoa: o repórter fez isso. O repórter fez aquilo. Um exibicionismo, uma arrogância, uma sofisticada picaretagem? Talvez tudo isso, mas com muito talento. Pessoal do vestibular de Jornalismo atenção: Leia as obras e Mailer, mas não tente repetir a dose. Esse drinque está batizadíssimo!

2 comentários:

Anônimo disse...

Pincei esta frase:

"...blefe que ele sustentou com matérias dos outros - um defeito?"

Ora, então ele não era um crítico contumaz? Ele lançou mão de um 'meta-processo': uma qualidade que poucos fazem c/ inteligência.

E "Yppies" hai kaiene! (cantiga folclórica americo-indígena)
Por onde andará o yuppy-modelo?

LIBERATI disse...

Querida Tinê, o cara é bom. Bom é pouco, ele é sensacional. Sou fã do cara. Ele cometeu pequenas picaretagens, falou muita bobagem, mas escreve bem pra caramba, e inventou um estilo. Ele , Gay Talese, Hunter Thompson, Tom Wolfe, Gore Vidal criaram uma nova forma de escrever matérias. (chamado de new journalism). Gore Vidal menos, pois é mais escritor, e em alguns livros historiador. Mailer sempre foi mais repórter, mas não podemos esquecer do seu jogo de cintura e o flerte com a literatura. Ele escreveu para teatro também, mas não vingou muito.
bjs