4.11.09

Dica do Gerddal : O centenário Roberto Martins, vigilante mal observado na circulação da MPB, tem obra evocada, nesta quarta, na ABL (grátis)


"Hoje não existe nada mais entre nós/somos duas almas que se devem separar/o meu coração vive chorando e a minha voz/já sofremos tanto que é melhor renunciar/a minha renúncia enche-me a alma e o coração de tédio/a tua renúncia dá-me um desgosto que não tem remédio/amar é viver/é um doce prazer, embriagador e vulgar/difícil no amor é saber renunciar."
 
    Tardou, mas não falhou. Enfim, neste 2009 do centenário do seu nascimento, uma homenagem, ao menos uma, muito merecida, a este vulto da MPB de discrição pessoal inversamente proporcional à projeção da sua música chamado Roberto Martins. Nos seus últimos anos de vida, ele foi amigo do meu pai e, na companhia do meu velho, tive oportunidade de conhecê-lo pessoalmente numa ida ao apartamento onde morava, na Rua Buarque de Macedo, no Flamengo, quando, em visita prolongada, pude saborear as histórias que ele nos contava, com cordialidade, fala mansa e algo gutural, da sua vivência no meio musical, num semblante de homem simples e aparentemente muito disciplinado. A exemplo de outro bamba, Haroldo Lobo, cujo centenário de nascimento ocorre no ano que vem (e quem se lembrará dele, mesmo com a importância que ele tem?), Roberto Martins foi guarda-civil - mais tarde, investigador, até desligar-se da polícia em 1939  - e, "circulando, circulando", no exercício da sua vigilância profissional, pôde conhecer intimamente a cidade e, especialmente à noite, aproximar-se das rodas boêmias, num então ameno Rio de Janeiro, e encontrar aqueles que se tornariam seus colegas em novo "métier", alguns deles seus parceiros. 
    Sucessos, teve-os a rodo, concentrados principalmente nos áureos antanhos dos anos 30 e 40 do século passado, dedicando-se com afinco, dos anos 50 em diante, à questão dos direitos autorais, já filiado à União Brasileira de Compositores (UBC), da qual foi sócio fundador. Além do fox "Renúncia", na epígrafe desta dica - com letra do petropolitano Mário Rossi e gravado em 1943 por um gaúcho, Nélson Gonçalves -, o ex-ritmista da orquestra de Simon Bountman, também com letra de Mário Rossi, mostraria a sua brejeirice no sincopado com "Beija-me", em registro de Cyro Monteiro. Antes disso, Roberto Martins se notabilizara, por exemplo, pelo primeiro êxito, "Favela" ("...dos sonhos de amor e do samba-canção"), de 1936, em parceria com Valdemar Silva, na voz de Francisco Alves, e por outro samba, "Meu Consolo É Você" (com Nássara), na voz de Orlando Silva, vencedor de certame carnavalesco da Prefeitura do Rio em 1939. Também no carnaval, na década seguinte, a serpentina da sorte o alcançaria no compasso de marchas imorredouras, como "O Cordão dos Puxa-Sacos" (com Frazão), em 1945, pelos Anjos do Inferno, e "Pedreiro Valdemar" (com Wilson Batista), em 1949, por Blecaute. Embora recentemente revivido em disco por Zélia Duncan e Moacyr Luz, é um compositor que precisa ser mais observado e considerado no eterno retorno das reminiscências, o que até inspiraria desejáveis regravações. "Lá na rua onde moro/ no 212/mora a mulher que eu adoro/que, quando eu passo, faz pose..." Quem sabe, um belo dia, o "212", mais uma dele com Mário Rossi?        
    Um bom dia a todos. Muito grato pela atenção.
 
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 A tempo: a homenagem a Roberto Martins, falecido em 1992, aos 83 anos, será prestada nesta quarta, 4 de novembro,  ao meio-dia e meia, por Cristina Buarque e pelo ótimo Samba de Fato, em mais uma atração da série MPB na ABL.

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