5.2.10

Dica do Gerdal: "Olha aí, Monsieur Binot!"- Joyce, essa mulher da cor brasileira, faz show, nesta sexta, ao pôr do sol em Ipanema


"Pula do muro/cai do cavalo/pula que eu quero ver/sombra no escuro/verde maduro/corre que eu quero ver/salta de lado/tiro cruzado/dança que eu quero ver..." 
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           Vivia o Brasil um dos seus anos de chumbo, 1973, e a música, recém-lançada, nem era dela, "Tiro Cruzado" - do então marido, Nelson Angelo (o mesmo autor de uma formidável letra para o clássico "Um a Zero", de Pixinguinha e Benedito Lacerda, e pai das hoje cantoras Ana Martins e Clara Moreno), com outro mineiro, Márcio Borges -, mas a participação de Joyce nessa faixa de um elepê da Odeon, a qual ouvi muito na ocasião, me chamou a atenção de adolescente para uma cantora diferente, que passei a curtir, desde então, nos bons idos de duradoura sintonia na extinta e saudosa JB-AM. Também diferente de muitos, com estilo todo seu e inconfundível, seria para mim, no decorrer dos anos e nos discos seguintes e precedentes (estes redescobertos depois), a compositora Joyce, de cujo talento são valores agregados a inteligência, a sagacidade e a observação refinadamente crítica dos fatos, não raro espirituosa e culturalmente referenciada. Ela que, apesar do apuro harmônico e dos arranjos bem elaborados em seu trabalho, nem é de complicar nas canções que faz, transmitindo o seu recado com simplicidade e objetividade e envolvendo o ouvinte - no meu caso, um antigo admirador - com a "hard bossa" do seu violão e o charme da sua voz guia, drapejada de "scats" e improvisos. "Banana", "Mistérios" (em parceria com Maurício Maestro"), "Clareana" (uma canção de ninar, feita na Itália, para as citadas filhas Clara e Ana), "Nacional Kid", "Guardados" (da lavra com Ana Terra)  "Feminina" e a dançante "Morena Bossa-Nova" (repaginando Vera Lúcia Couto dos Santos, primeira miss Brasil negra e musa inspiradora da famosa marcha carnavalesca de João Roberto Kelly) são exemplos significativos desse jeito peculiar que Joyce tem de criar e de mostrar a sua intensa musicalidade, que até, por força dessa singularidade artística no trato com a canção, faz parecer sua obra de outrem, como nas expressivas "Vida Jogada Fora", de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro, e "Sonora Garoa", do "neomatuto" santista Passoca.  
           Fazendo temporada, em 1977, em Nova York, Joyce conheceu o soteropolitano Emmanuel Alves Moreno, o Tutty Moreno, baterista e ex-saxofonista na sua cidade natal, que vivia, então, na Big Apple. Casada com Tutty pouco depois, a ele dedicaria uma de suas mais atraentes e suingadas composições, "Fã da Bahia", também bastante executada na retrocitada JB-AM. Ambos, no segundo semestre deste ano, terão lançado no Brasil um CD a dois - com a foto do casal, sorridente, na capa -, intitulado "Jazz-Samba & Outras Bossas", que pude comprar, há dois anos, em Paris, numa viagem de férias. Produção naturalmente feita no capricho, que já vale, entre outras virtudes, pela lembrança de Haroldo Barbosa e Luiz Reis e pela regravação de um "hit" da dupla, o samba "Devagar com a Louça", conhecido primeiramente em registro primoroso do conjunto Os Cariocas. Nesta sexta, 5 de fevereiro, às 18h ("flyer" acima), essa nativa de Copacabana, de tardes cariocas, tantas, vividas no Posto 6, faz show informal em outro pedaço de areia e mar bastante visitado na sua juventude, o Posto 9, na contígua Ipanema, acompanhada apenas do próprio violão. Cantora e paisagem mais uma vez interagindo e se combinando, como o chinês e a bicicleta.

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