6.2.11

Antônio Carlos e Jocafi em temporada no Vinicius: vozes da Boa Terra que têm o coração como expressão




"Ei lá, maré brava, maré mansa/ei lá, vou na trilha da esperança/ei lá, vou no passo da alvorada/ei lá, mar, amor e namorada...
 
        Prezados amigos,
 
        Mudei de ideia em relação a Antônio Carlos e Jocafi: são do ramo, são bons de fato. Brincadeira, naturalmente, pois sempre os considerei bambambãs num tipo de samba bem cadenciado, envolvente, ora agitado, ora malemolente, feito com a sabedoria de uma simplicidade que atinge em cheio o agrado popular, uma obra de timbre próprio na MPB e firma reconhecida pelo sucesso. Justamente por isso, por ausência de rebuscamento na melodia e na harmonia e presença constante de refrães de imediata assimilação, por exemplo, foram de encontro a intelectos que não usam o coração como expressão, num tempo, quando surgiram, endurecido pela mão de ferro do Poder fardado, trazendo como consequência ou efeito dominó, não raro, em certos círculos, uma certa ideologização excessiva nas escolhas do dia a dia do cidadão comum, mesmo triviais, como a compra de um disco - quem gostasse de um artista A, "engajado", não era bem visto se prestigiasse o artista B, "alienado pelo romantismo", quando, a meu ver, fã que sou desse nosso universo musical, vale mais a contribuição que cada artista dá, com o seu jeito e a motivação que tiver, na composição deste mosaico singular e incrivelmente sedutor do nosso cancioneiro, rútilo em variedade. 
        Soteropolitanos bem-sucedidos em festivais da sua cidade na segunda metade dos anos 60 - e ainda atuando separadamente -, Antônio Carlos Marques Pinto (então guitarrista da orquestra do maestro Carlos Lacerda e futuro marido da cantora Maria Creuza, uma baiana de Esplanada criada na capital) e José Carlos Figueiredo (que cursou Direito até o terceiro ano e se tornou Jocafi seguindo a redução onomástica  pela qual, por exemplo, o carioca Antônio Gílson Porfírio foi Agepê e o saltense Odmar Amaral Gurgel, de trás para diante, foi o maestro Gaó) vieram para o Rio e uniram-se profissionalmente na famosa parceria em 1969, ano em que já  lograram baita repercussão com a conquista do segundo lugar, no IV FIC - edição nacional, da TV Globo, com o samba "Desacato", o que, pouco depois, valeria a ambos, na mesma emissora, um reforço de tal projeção nacional com músicas feitas para novelas e seriados vistos de norte a sul, como "Shazam" e "Uma Rosa com Amor"  Contratados da RCA Victor, lançaram por ela vários elepês, bem executados, de um dos quais "Você Abusou" teria diversas regravações e ganharia meios de comunicação em outros países, como na França, cujo "ulalá" de satisfação com o samba o fez ser cantado na versão de título "Fais Comme L`Oiseau", gravado por Michel Fugain. No ano passado, em Salvador, pelos seus 40 anos de carreira, a dupla foi homenageada pela Escola Baiana de Canto Popular, no palco do Teatro Solar Boa Vista, com  o show  "Kabaluerê".
        Desde quinta passada, a partir das 23h, Antônio Carlos e Jocafi estão em temporada no Vinicius, em Ipanema (Rua Vinicius de Moraes, 39, na esquina com Rua Prudente de Moraes - tel.: 2523-4757). Lá, têm hoje, 6 de fevereiro, apresentação, que continua, na próxima semana, mais uma vez, de quinta a domingo (de 10 a 13 de fevereiro). Recomendo, no "link" final, uma entrevista  recente e bem interessante com ambos, pela Record, na qual, entre inéditas e sucessos, Jocafi faz uma linda interpretação de "Catendê", também defendida com Antônio Carlos em festival, no início dos anos 7O. Felizmente, eles não ficaram na de horror com a crítica nem rifaram os violões, levando adiante o seu "samba-joia", ou seja, a joia de samba popular, animador de tantas festas pelo país, que tão bem sabem fazer.    
       Um bom domingo a todos. Muito grato pela atenção à dica.
 
       Um abraço,
 
       Gerdal
 
Pós-escrito: nos demais "links", composições de Antônio Carlos e Jocafi: 1) "Você Abusou", cantada por Elisete Retter, uma baiana que cursou belas-artes, no Rio, na UFRJ, e vive em Tel Aviv desde 1991; 2) "Conceição da Praia", cantada em gravação da dupla; 3) "Jubiabá", mostrada por eles com informalidade; 4) a belíssima "Catendê", de refrão supradestacado, na gravação de Maria Creuza com o violão de Toquinho e contracanto deste e de Vinicius de Moraes; 5) "Santo Antônio Glorioso", na referida homenagem que lhes prestou a Escola Baiana de Canto Popular; 6) o mesmo grupo dessa escola canta "Dona Flor e Seus Dois Maridos", que é faixa de ótimo CD que os compositores, com o escritor entre eles na foto da capa, gravaram em 1996: "Antônio Carlos e Jocafi cantam Jorge Amado", com arranjos e regência do baterista César Machado e a valiosa participação, entre os músicos, do pianista Fernando Merlino e do saxofonista e flautista David Ganc; 7) "Encabulada", samba ouvido em gravação da dupla.    
           
        http://www.youtube.com/watch?v=_l_KpG1A9_8 ("Você Abusou")
 
       http://www.youtube.com/watch?v=OA3FmLJYWNc&NR=1 ("Conceição da Praia")
 
       http://www.youtube.com/watch?v=RCvzBhGnagw&feature=related ("Jubiabá")
 
       http://www.youtube.com/watch?v=FLq_-oF0RCY ("Catendê")
    
       http://www.youtube.com/watch?v=ICJYXRE0RLc&feature=related ("Glorioso Santo Antônio", na referida homenagem que lhes prestou a Escola Baiana de Canto Popular)
 
       http://www.youtube.com/watch?v=8k7HeKrTq3E ("Dona Flor e Seus Dois Maridos")
 
       http://www.youtube.com/watch?v=2RZdQFWnD5w ("Encabulada")
 
       http://noticias.r7.com/videos/antonio-carlos-e-jocafi-participam-do-entrevista-record-musica-desta-sexta-feira-21-/idmedia/1c69703cf20221d7cd66e5265f29115b.html (entrevista com Antônio Carlos e Jocafi - 40 min)

2 comentários:

Marciso Pena Carvalho disse...

Conheci a dupla logo que chegaram ao Rio, através de um amigo comum, o também compositor baiano (ótimo, por sinal) Walter Queiroz. Lembro dos rachas (peladas) que faziamos às quintas feiras numa quandra de futebol de salão no Horto para perdermos alguns quilos, os quais logo depois eram recuperados pelo chope gelado do bar da esquina com a rapidez de uma banda larga. Sempre desconfiei que chope depois do racha, ou baba, como se diz na Bahia, era o na verdade o verdadeiro pretexto.
Duas grandes figuras e dois grandes nomes da MPB: já escreveram seus nomes nela.

Grande abraço, querido Bruno.

LIBERATI disse...

Querido amigo Marciso, eu me lembro de ter ouvido, ao vivo, Antonio Carlos e Jocafi, numa festa, naquele tempo em que Walter Queiroz estava aqui no Rio. Foi um tempo muito musical - Fátima, você e seu irmão, Ruy Quaresma e a mulher dele que tocava flauta divinamente e o Toddy (creio que este era o apelido dele, um cara que tomava coca-cola a noite toda enquanto o papo rolava e o violão ia de mão em mão) ,acho que tinha mais gente. Eu que não toco nem galinha, só ficava ouvindo. Lembro de você repetindo no violão um solo especial do Hendrix que ele tocou em Woodstock. Todos daquela turma tinham muito talento e vejo que estão por aí fazendo música e aprontando artes,até mesmo gráficas.
Você tem razão, a Antonio Carlos e Jocafi já escreveram seus nomes na História da MPB.
Tenho uma tese, a de que um dia o Brasil vai acordar e reencontrar a sua música de novo,(plural é claro) e sair desse surto imposto pela mídia hegemônica que só dá sertanejo-fake, pop-axé e esse roquinho adolescente. A música brasileira é maior do que isso.
grande abraço