31.5.08

Minha vizinha Chavista ressuscita e faz a crítica final da novela Duas Caras


Foi neste sábado, dia de fazer feira, arrumar a casa e ver as modas, acordar TARDE!
Dim-dom...Dim-dom.... Tocou a campainha do meu apartamento logo cedinho, minha mulher para variar orava pelo bem estar do universo e nesse afazer não pode ser interrompida.
Cheio de sono fui trôpego até o olho mágico para tentar ver quem perturbava meus sonhos mais lindos. Vi um vulto escuro que me apavorou. Parecia um fantasma...
Dim-dom, Dim-dom....
-Quem é? Perguntei intrigado.
-Soy yo, compañero!
Reconheci a voz inconfundível da minha vizinha chavista. (ela deu agora para falar em portunhol)
Procurei a chave na mesinha da sala...no meio de desenhos, canetas de nanquim, recados de todos os tipos, rolos de durex, tickets de supermercado e uma calcuradora Texas... Achei o chaveiro que tem como penduricalho um plástico imitando uma camisa do Botafogo. Estava úmido pelas últimas lágrimas da derrota para o Corinthians...
Mal abri a porta e tomei um novo susto - minha vizinha estava de burca!
-O que é isso Dona.... (sempre esqueço o nome dela)
- É para fugir da dengue, não estranhe o cheiro - é perfume de citronela, estou me defumando em casa com velas de citronela e andiroba. Não estranhe esta raquete- é elétrica, funciona a pilha, comprei num camelô da Uruguaiana, é ótima pra matar mosquisto. Eles morrem tostadinhos. Mas não foi para lhe dar explicações que vim aqui.
- Tá certa! Então por que foi que a senhora veio bater na porta do meu apartamento nessa hora tão temprana?
- É que quero que você escreva no seu grogue (ela nunca vai aprender que eu escrevo um blogue) a minha crítica definitiva da novela Duas Caras. Tem uma caneta?
Lá fui eu de novo cavoucar a minha mesinha a procura de alguma coisa que escrevesse e um papel em branco. (Obs: casa de desenhista em geral quase não tem lápis com ponta e caneta com tinta)
- Fala, Dona....(acho que nunca vou saber o nome dela)
-Escreva aí! - "Crítica definitiva , curta e grossa da novela Duas Caras, que termina hoje e que teve a coragem de botar na sala de estar das famílias brasileiras o cotidiano de uma favela atípica do Rio de Janeiro":- Foi o maior barraco! E não é uma metáfora, não.Todos os personagens armaram literalmente barracos o tempo todo: O Juvenal Antena, a Dona Branca , proprietária e viuva do reitor da Universidade Pessoas de Moraes, a destrambelhada da Célia Mara, a maluca da Sylvia , a Maria Louca , etc, etc etc...Enfim, o sujeito mais comportado da novela foi o Ferraço com uma interpretação magnífica do Dalton (ela tem mania de falar dos atores como se tivesse a maior intimidade com eles). Ele teve uma atuação digna de Victor Mature. Com uma só expressão conseguiu comunicar todos os estados de alma de seu personagem Um gênio da síntese.
Tenho dito! E ponha também no seu grogue estas reflexões - Foi aí que tirou de dentro da burca um papel onde estava ecrito "Teoria da novela". E se mandou para seu refúgio anti-aedes aegypt (é assim que se escreve?)
Eu fiquei ali, com minhas olheiras, com minha perplexidade olhando aquele papel que me revelou a insustentável leveza do ser de minha vizinha chavista...(publico qualquer dia aqui)
Agora, deixem-me dormir...ZZZZZ
(De noite, fui conferir o último capítulo de Duas Caras e prometi a mim mesmo que nunca mais vejo novela)

Enquanto meu Site não sai...Ilustra "Martelo pregado"


Como pode-se ver aqui, ilustrador também instala: Martelo e prego sobre madeira pintada de branco e moldura.

29.5.08

O Salão Carioca de Humor vem aí...


A abertura oficial do XIX Salão Carioca de Humor será em Junho.
A Exposição vai rolar na Casa de Cultura Laura Alvim na Avenida Vieira Souto, nº176 - Charges, Cartuns, Caricaturas, HQs de altíssima qualidade.
Todos lá!

Auguri - Festa Italiana no Centro do Rio


Samba e tarantella animam festa ao ar livre no Centro do Rio
Uma inusitada mistura de samba e tarantella no Centro do Rio promete animar o fim de semana de 30/05 a 01/06. É a IV Festa da República Italiana, que no melhor estilo das festas de rua das cidades do interior da Itália, reúne, anualmente, na Praça Vírgilio de Mello Franco, no Castelo, cerca de 50 mil pessoas.

Este ano, as atrações musicais incluem os prestigiados e carioquíssimos grupos de samba como o Fundo de Quintal, Casuarina e a Orquestra Tabajara e atrações italianíssimas como o tenor Alessandro Safina, os grupos folclóricos Arcobaleno, Tarantolato e as orquestras Bianchinni e Felice Itália.

− Nosso objetivo é festejar os 62 anos da nossa República e estreitar ainda mais os laços entre brasileiros e italianos. Afinal, a colônia no Estado tem aproximadamente um milhão de italianos e descendentes. − informa o organizador e cônsul-geral da Itália no Rio de Janeiro, Massimo Bellelli, que não esconde uma ponta de orgulho ao constatar que o evento já entrou para o calendário da cidade e a cada ano atrai mais visitantes.

À parte do farto cardápio musical, acontece a Feira das Regiões e dos Produtos, que homenageará a Calábria, região de onde provém 70% dos italianos que emigraram para o Brasil. São 20 barracas de venda de produtos típicos como vinhos, salames, presuntos, queijos, cafés e doces diversos.
A praça de alimentação, com mais 20 barracas, terá estrelas da gastronomia, como o chefe de cozinha Mario Tacconi, o pizzaiollo do Domingão do Faustão em 2001 e 2002, que, em sua barraca, apresentará inovações como variadas versões de risoto, além, é claro, de muito macarrão e pizza.

A IV Festa da República Italiana, com entrada franca, será na Praça Virgilio de Melo Franco, localizada nos fundos Consulado-Geral da Itália, com acesso pela Avenida Franklin Roosevelt. O funcionamento obedece os seguintes horários: 30/05 (sexta- feira), das 18:00 às 23:00h; 31/05 (sábado), das 15:00 h às 22:30h e 1/06( domingo) das 15:00 às 22:30h.

Programação de shows:
30 de maio (Sexta-feira)
18:00h − Orquestra Tabajara
22:00h − Casuarina

31 de maio ( Sábado)
15:00h −Apresentação dos alunos da Escola Italiana
15:30h – Coral da Associação Abita
16:30h – Grupo Folclórico Tarantolato
17:15h − Daniella Colla
18:00h – Bianchinni Orquestra Show
21:00h − Alessandro Safina

1 de junho (Domingo)
15:00h − Projeto Luar de Dança
16:00h− Coral do Circolo Italiano
17:00h− Grupo Folclórico Arcobaleno
18:00h− Orquestra Felice Itália
21:30h− Fundo de Quintal

Laerte e seus Piratas na HQMIX


Clique na imagem para ampliar e todo mundo lá!

ESSEPÊ - um cometimento poético


(Generalizações, reducionismos, simplificações, parcialidades, preconceitos vários, obsessões, implicâncias...tudo isto e algo mais que sempre esqueço de dizer fazem parte da crônica, acrescidos esses pecados de uma dose de petulância e de um certo ar de caga regra de quem fala.
É por essas e outras que sou suspeito quando escrevo sobre a Paulicéia desvairada.
Mas hoje vou partir para um cometimento poético que começou a acontecer enquanto rodava nas linhas do metrô sentido zona norte... espero que me desculpem o atrevimento
)...
ESSEPÊ
São Paulo, cidade de
São Paulo, essepê
Semáforos em transe...
Primeira geração digital e pré-história na 23 de maio engarrafados/
Cemitério do Araçá guarda meus mortos, benza Deus!
Cidade,metróple,megalópole,
Abrigo e túmulo de migrantes
Mistura terminal e casa modernista/
Presídio que vira praça
Praça que vira presídio...
Paradoxos, xerox, compro ouro!
Massas e I pod, café expresso na galeria Olido
Avenida Paulista, rolex que brilha sob a chuva ácida
Cine Vera virou casa de forró
Mendigos embaixo do viaduto celebram com CO2 o sucesso do novo plano urbanístico
Miséria high tech?
Luz, Tiradentes...Onde andará a menina linda da avenida Água Fria?
Cidade mãe com nome de santo - cidade travesti ou...
...Medéia ensandecida que mata seus filhos com hamburgers
Aristocracia de 450 anos em banheiras J'Accuse!
Zola nunca te imaginaria assim tão germinal
Burguesia de Caras maquiadas, sorry dentes no programa de TV
Periferia mardita, fossa, poço artesiano onde falta cano
Well then what can a poor boy do
Except to sing for a rock 'n' roll band
Serra da Cantareira, horto florestal, domingueira subalterna
Operário dormindo no vagão, 19 horas em ponto/
Pichação no monumento das Bandeiras: - Empurra que vai!
Movimento CON CRE TO
Reconhecimento de gêmeos pichadores globalizados
London Calling...motoboys em ação, zig,zag...movimento abstrato
Cada um por sí e Deus contra!
Cadê o chá das 5 do Mappim?
e a Barão de Hip Tapete ...Ninja? - Quero um calçado de cromo alemão!
Uma anta no vale do Anhangabau pergunta por Macunaíma...
- Cadê o coração dos outros?
Cinema boca do lixo, Bandido da luz vermelha/ O grande momento!
Onde antigamente tinha erva mate e hoje corre um rio sufocado,
achei o Buraco do Adhemar!
Viaduto Santa Efigênia dourado? São Bento corado? Angelus e sino tocando
Meio dia macacada! Uma hora para o almoço, cartão de ponto...
Mário, arrebenta tua lira! Arlequinal, arlequinal... escarra no Minhocão
Desvia as águas espraiadas para o Tietê, marginal!
Paca, tatu, cotia não...Paca, tatu, cotia não!
Perderam meu nonno Gaetano na revolução de 32
Punk e Emos fora de lugar, Tarsila cadê meu "Estadão"?
Tá com o Lobato lá no Sítio!
Estatuto do coração, Raízes do Brasil, Rua Cuba, anime, mangá
- Mano me dá uma mano, che!
Bolivianos escravos costuram o bom retiro
Guevara se perdeu na mata hermano, ahora ninguém é de ninguém na vida todo passa
Coreanos enjaulados à espreita no container - Haverá um mundo lá fora?
O Torá, onde está, amici miei?...
Lá sei eu! Eu não sou daqui, tô de passagem...
Espanca o cara meus! Mói os ossos do tapuia , depois joga no Museu do Ipiranga,
Proclama a independência! /
Faz uma tatuagem, e o perito que não chega!
Arigatô, Sharihotsu!
Cidade provisória, casas de pedra só em Santos!
Tudo a ver na Sloper, Dalu, fashion Week, Bienal, Anhembi, Galerias, Shopping Centers/
Rua Alasca
- Nada vejo, a não ser neblina, vou bater o coco...
Crack! Boa Vista, Largo São Francisco, Ladeira da Memória
Cidade fantasmagórica, lume móbile na cracolândia
Teatro Municipal leva ópera que barra funda! Que barafunda!
O tenor canta a soprano...o rei da vela pede smoke
Arquitetura em transe...Copan e Morumbi,
FAU, vão central, Masp, cadeiras de Lina Bo...
Ladrões de Picasso e Portinari correm para o Embu
E eu com isso, Guaçú!?
Pizzas e sábados todos iguais...Padaria cheia
Casa Verde , Mandaqui, manda ali...Mercadão, mortadela!
Me dá um bauru, mas sem picles!
E aqueles ojos verdes? Eu os comeria a vinagrete.
Chaminé sozinha em Santana observa um templo
fiéis às pencas...
O padre en-canta o Ibirapoeira
Mooca imortal, rua dos Italianos...
Vila Galvão, Trem das Onze/ Arnesto nos convidou prum samba, ele mora do Brás/
Nóis fumo e não encontremo ninguém...
O Bexiga canta numa cantina
Pão quentinho , inigualável, macarronada da mamma
Homenagem aos mortos do massacre da Armênia ao lado do Tamanduá-teí
Baladas, xavecos, playboys, hip hop...
Putas na Augusta e o movimento perpétuo
Na Aurora mulheres da vida sonolentas sacodem os quadris nos inferninhos
- Manda um "Fogo Paulista" goela abaixo e esquece...
Meu pai remando no Tietê. Sai daí véio!
Priscila rainha do deserto do Tucuruvi abre o casaco em frente ao Belas Artes
Nos subterrênos da Consolação o Primo Basílio conversa com Elias Canetti
Enquanto na Baixada do Glicério, no Paulistano da Glória homens negros elegantes esquentam os tamborins, Vinicius se enganou redonda-mente
Liberdade e Paraíso viraram estações, meu Deus, onde está a Sé nisso tudo?
Marco Zero da civilização! Capital monopolista, pirâmide da indústria , topo panóptico da America Latina!
Borba Gato tá se achando!
Cidade sem outdoors...tem cimento no meu capuccino!
Helicópteros levam a nova classe
por cima dos edifícios e antenas
captam o som da nova era : Não é o Som de Cristal. - Já era! - Qual a cotação da Bolsa de Valores, primo? Te liga no Mercado Futuro, tá ligado?
Ruído...- Desce um Pignatari!...
- Me serve um "Baião de dois"!...
Artigo do professor da USP explica o nacional-popular
A Gazeta é esportiva ...escadarias/ Cásper Líbero
Ao fundo ouço um gol...-Foi do Curintia ou do Parmera?...- Foi do Sumpaulo?
- Não , foi do Juventus...da rua Bariri. Você se alembra? É rua Javari, seu stronzo!
A mardita pinga que me atrapaia/
Veloz passa a noite e um novo sol nascerá violeta
atrás da nuvem cigana, milhões de carros como gafanhotos virão para o apocalipse
e novos baianos te curtem numa boa/ na Vila Madalena/
A espanhola perdeu o gato, seo Rubinato!
Praça da Res-púbica abrigava patinhos
A do Patriarca patrões...fascismus architetonicus no Anhangabau da felicidade
Cavo e no fundo do quintal, acho um cachorro morto,
É um lobo! É um lobo? É cachorro, meu pai jogou no bicho/
E esse livro do Engels embaixo das tábuas do assoalho? Isso é conto da carochinha...Vire a página! -Quem hoje quer saber a história da Família e da Propriedade Privada? Sem essa...
Esqueci de chorar na rua Barão de Limeira.
Lá passei minha adolescência. Quando fiz 18 anos me mandei pra São Miguel Paulista...
Fui ser químico, zio Vincenzino...encher de mata-baratas latas de aerosol. Mas isso foi em Santo Amaro...fazia um frrrrio!!! Como tem santo nessa terra de Piratininga!
-Matou alguma barata figlio mio? - Necas, mas nunca mais peguei pulga. Kafka aqui ia se dar bem.- Ciao bambino, ciao...
Onde é a saída, zio?
-Pega a marginal Pinheiros e dobra à direita, sempre à direita...
-Eu volto, um dia eu volto, Voltolino!...

28.5.08

Hoje Fernando Pacheco Fogo e Pátina no Espaço de Cinema

A Editora C/Arte e Livraria Luzes da Cidade de Botafogo
convidam seus clientes e amigos para o lançamento do livro
FERNANDO PACHECO, FOGO E PÁTINA
no próximo dia 28 de maio, quarta-feira, à partir das 19 horas.
Rua Voluntários da Pátria, 35 - dentro do Espaço de Cinema.
Tel: (21) 2226-4108
Fernando Pacheco , Fogo e Pátina , texto de Jacob Klintowitz, apresentação de José Eduardo Gonçalves , editora C/Arte, Belo Horizonte, MG, 2007, 192 páginas, fartamente ilustrado, edição bilíngüe (português/inglês, R$ 120 reais).
Fernando Pacheco, o pintor mineiro-universal tem sua obra de cunho expressionista fartamente exposta e destrinchada neste volume de excelente qualidade gráfica. Filho deste Brasil imenso, onde em cada cantão desponta um mestre, Fernando é, ele mesmo, o "fogo e a pátina" que jorram de suas mãos.

Caro leitor prepare-se para o show de cores que cobre madeira, pedra, vidro, papelão, papel e tela. Mala, sandália e garrafa. O pincel engenhoso do pintor Fernando Pacheco não conhece limites.

Enquanto meu Site não sai...Ilustra com Caricatura de José de Alencar na Geléia Geral

27.5.08

1968, por aí ... Hoje no Bar Canto Madalena


Hoje, dia 27 a partir das 19 horas, o grande jornalista e escritor Mouzar Benedito lança seu livro 1968, por ai...Memórias Burlescas da Ditadura no bar Canto Madalena na Rua Medeiros de Albuquerque, 471 , claro, na Vila Madalena em Sampa.
Todo mundo lá!

Partidos e Homens Partidos


(Este artigo do Professor Marco Aurélio Nogueira foi publicado no jornal O Estado de S. Paulo no 24 de maio de 2008)
Não vivemos somente um "tempo de partido, tempo de homens partidos", como diz a poesia de Drummond. O nosso também é um tempo de partidos partidos.
Os partidos políticos sempre se caracterizam pela divisão interna. Mesmo quando monoliticamente constituídos, são associações plurais, cortadas por distinções muitas vezes marcantes. Por existirem em função da conquista e da manutenção do poder, tudo neles adquire grande dose de tensão, virulência e dramaticidade. Como são compostos por diferentes grupos e pessoas, podem ser guiados mais por interesses e projetos particulares que por orientações coletivas. Isso é verdade especialmente se estas últimas derivarem de ordens e comandos estabelecidos de modo unilateral pelas direções centrais, que sempre poderão ser acusadas de não terem a devida sensibilidade para fatos e acontecimentos mais próximos das bases. Além do mais, os dirigentes de um partido podem se converter, eles mesmos, em uma parte dentre outras, transformando-se em uma oligarquia que termina por atazanar e desfibrar bases e militantes.

Tanto são divididos os partidos que boa parte de sua rotina é dedicada a compor consensos e unificar interesses. Não é por acaso que muito da discussão repouse na questão do modelo de deliberação a ser seguido. Há duas grandes formas de centralismo (ou seja, de coordenação e unificação) - o burocrático e o democrático - que refletem, tipicamente, processos de tomada de decisão em que o poder é imposto a partir de cima ou é construído a partir de baixo. Quando levado a sério e efetivamente praticado, o procedimento democrático é o único que consegue fazer com que as lutas internas em um partido terminem sem sangue, expulsões e dissidências. Tal procedimento, no entanto, exige que a dinâmica interna e a conduta pública do partido estejam impregnadas de idéias e princípios profundos, e só pode frutificar se o partido for ele próprio "aberto" para o mundo plural da sociedade.

Os embates partidários de hoje estão longe deste padrão. Primeiro, porque neles há poucas idéias e poucos parâmetros programáticos. Depois, porque as direções não têm peso e representatividade para conduzir o barco. Entre as alas dos partidos, inexistem divergências de fundo. Briga-se por migalhas, por postulações pessoais, por pretensões eleitorais. Na melhor hipótese, as disputas sugerem a existência de algum desentendimento doutrinário ou estratégico mas não são assumidas como tais.

Os casos que ocupam o noticiário brasileiro - o do PT em Minas, o do PSDB em São Paulo -, são emblemáticos desta situação. Alckmin quer ser candidato simplesmente por se julgar qualificado para o cargo, não por possuir proposta específica ou divergir em termos substantivos do que pensam os dirigentes de seu partido. Sequer questiona a aliança com os liberais do DEM, a ponto de iniciar sua campanha abraçado ao PTB e ao PSDC, que têm bem menos densidade e expressão. Faz isso por falta de opção e porque tem os olhos na propaganda eleitoral gratuita. Age por dinâmica própria, pouco se importando com a agenda futura do partido ou com o fato de seus companheiros vereadores pensarem de outro modo.

No caso do PT em Minas, as divergências são sérias. Tocam num ponto delicado da história do partido, o das alianças. Deve o PT privilegiar mais seus próprios interesses ou mais os interesses da sociedade? Deve governar compondo alianças que beneficiem a população e facilitem a implementação das melhores políticas ou fazê-lo com os olhos nas disputas eleitorais? Os adversários em um âmbito da federação devem sê-lo também em outro? Não são questões retóricas ou de detalhe, e diante delas não há como tergiversar, ou dizer que se deseja o melhor dos dois mundos.

Hoje está evidente que PT e PSDB não têm uma compreensão clara do papel que devem desempenhar, da estratégia a seguir, da contribuição que imaginam dar para a continuidade e o aprofundamento da democratização ou a eliminação da desigualdade social no Brasil. Como não há clareza teórica e programática nos partidos, como eles, a rigor, não sabem bem o que propor à sociedade e não possuem maior densidade cultural, as divergências fogem para os bastidores, ou seja, para as questões regionais, pessoais, grupais, que se tornam mais relevantes que as outras.

A situação desgasta os partidos no nível macro e no longo prazo, mas acaba por beneficiar suas correntes e lideranças de maior destaque, que exploram justamente as rusgas localizadas para ganhar terreno na luta interna, manejando desejos, vaidades e postulações. É bem verdade que neste universo, aparentemente louco e paradoxal, ninguém rasga dinheiro e as chances de unificação jamais desaparecem. Ainda quando divididos, raramente os partidos cometem suicídio. Chegam mesmo a alcançar alguma unidade de ação quando se trata de aumentar a força de seus candidatos.

O problema não é, portanto, de viabilidade eleitoral ou sobrevivência fisiológica, mas de razão de existir. Nosso tempo é certamente de homens partidos, mas talvez não seja mais um tempo de partido. É difícil tomar partido hoje em dia, ainda que seja fácil se indignar. E há algo na estrutura da vida atual que rouba condições de possibilidade aos partidos políticos. Eles vagam meio sem rumo, como mortos-vivos, no cenário contemporâneo.

Consequentemente, aqueles que se dedicam a mantê-los em funcionamento deveriam se preocupar em lhes dar oxigênio de melhor qualidade. Deveriam provê-los de idéias claras, identidades e estratégicas consistentes, paixão cívica e visão que ultrapasse a dimensão do poder. Coisas que estão uma camada acima do chão operacional e rotineiro da política. Este chão, no entanto, é onipresente, e tende a magnetizar tudo.
Marco Aurélio Nogueira é Sociólogo e Professor de Ciências Políticas

Enquanto meu Site não sai... Capa inédita com Ednardo e o Pavão Misterioso


Esta ilustração foi feita no fim da década de 70, na época em que o compositor e cantor Ednardo fazia um baita sucesso e tinha até uma novela das oito que tocaca a música dele. Era para ser capa de um caderno Serviço Completo do JB, imitava as capas de libretos da literatura de cordel. Na última hora foi substituida por outra arte e ela permaneceu inédita.
Foi feita na técnica da "xilogravura de paulista" que aqui no Rio , segundo a Tinê se chama de "xilogravura de preguiçoso", e na Esdi tirava ponto da nota do malandreco que se aventurava nessa astúcia. Para lembrar: esta técnica é feita com a marcação das ranhuras (imitadas) com guache branco , depois tudo é entintado com nanquim preto e quando seco é submetido a um jato poderoso de água, o guache sai e fica parecendo xilogravura feita na madeira. O bacana é que surgem as irregularidades, surpresas que a gente não calculou...

26.5.08

Enquanto meu Site não sai... Ilustra "Macunaíma"


Nanquim e aguada sobre papel Shoeller
NR:Nessa época eu nem imaginava um dia me tornar ilustrador

25.5.08

24.5.08

Enquanto meu Site não sai...Caricatura de George Orwell


Nanquim sobre papel sulfite e colagem de texturas

23.5.08

Crônica da Tinê - "Superstar"


Entrávamos no Cine Roxy em Copacabana, aboletados na turma do gargarejo (ou, como se dizia então, na posição "eram os deuses astronautas") para assistir a estréia. Na vigésima vez, quando o telão branco se abriu, já sabíamos toda a letra do musical de Lloyd-Webber, enquanto nossos pés batiam no ritmo de Caifás.
"Caiaphas said:
Jesus, you must realize the serious charges facing you. You say you're the Son of God in all your handouts, well, is it true?"
Hoje, ao ver os santinhos eletrônicos na caixa de correio, deduzo que os amigos remetentes me julgam meio perdida às portas do Inferno! Alighieri soube como ninguém usar sua verve poética para descrever as labaredas numa obra magnífica - A Divina Comédia - e, o mais curioso, os tomos Céu e Purgatório não têm a mesma pujança imaginária, não apelam com a mesma graça junto ao leitor. Não fossem os belos talhos-doces de Dührer para dar um visual bacana aos cantos, acho que os dois primeiros livros seriam dispensáveis. Numa explicação rasteira, eu diria: os bandidos são sempre mais interessantes que os mocinhos. O perfil da Queda traz inúmeras nuances: sentimentos, acertos, desejos, erros, dúvidas, buscas, ideias, ações, emoções, poder, aventuras que moldam a vida dos pobres mortais, uns mais que outros. Sidharta Gautama saiu de seu palácio superbom para "cair no mundo" - literalmente, quinhentas e treze vezes, dizem - para conhecer a Luz.

Não sei se Dante viveu como pedra no caminho ou como airosa borboleta, se fez uso da memória retro-inativa, ou se foi e voltou para contar, por mim nem precisava ir: ele criou seu cenário infernal espelhado na condição humana. Bastava circular atento pelas ruelas, sacristias e tabernas de seu tempo com um bloquinho na mão (ah, se ele dispusesse de uma filmadora!) e depois comparar os dados com sua própria existência (mentiras, negações e projeções inclusas) neste planeta de variadas paisagens (catástrofes naturais inclusas), habitadas por seres inteligentes tão caóticos que precisam desesperadamente acreditar em algo além e acima (ou abaixo) de si por não suportarem ser humanos e - como antídoto a esta precariedade - desejarem com ardor ser iguais Àquele.

Os proto-humanos colocavam suas figuras no fundo das cavernas. As Calimérias e os Phebos tinham lá seus favoritos do Olimpo, réplicas do mundo dos mortais com a vantagem de nunca morrerem, no máximo serem transformados em outra coisa, como ânforas e taças de vinho. Lupicínias e Fábias tinham em suas casas altares particulares à Vaticana, protetora dos lares. Os egípcios viviam para o além-túmulo, num anseio de que esta vida carnal chata acabasse o mais rápido possível. Os celtas tinham os seus pozinhos: viam quem bem entendessem ver. Os hindus têm até hoje uma profusão de deuses, tanto quanto as cores e as luzes que alegram o reles existir. Nos regimes totalitários distribuíam retratinhos dos líderes como consolo aos camaradas. Theolinda tem uma prateleira cheia de doces e flores para a entidade Menina. O pasteleiro tem um nicho em sua loja para oferendas ao mítico imperador Huang. Seu Nicodemos tem um oratório a São Jorge. Dona Helga tem os retratos de seus ilustres antepassados sobre o piano de cauda. Seu Antenorth tem uma enorme bandeira americana pendurada na sala de jantar, sobre a escultura de uma águia-de-cabeça-branca. As caligrafias islamitas... A estrela dos hebreus... O choro das mulheres ao pé da Santa Cruz...
Eu tenho apenas a minha natureza, telas em branco e muitas dúvidas, para não falar das dívidas.
O que seria de nós se não existissem sonhos, fábulas, contos, símbolos grafados... na areia, que a maré alta levará; na pedra, que o vento apagará; no papel, que o fogo queimará? O que seria de mim sem os amigos pios que acreditam ter o dever de transmitir a sua própria fé?
Se meus pés tremerem, se meus dentes rangerem, será talvez por pensar nesses assuntos longe de qualquer inferno possível. Mas também pode ser uma febre passageira.
Tinê Soares – 21/05/2008

Enquanto meu Site não sai... Ilustra "Tiro e queda"


Lápis de cor e ecoline sobre papel Canson

22.5.08

Crônica de Rosa Artigas - "Decifra-me ou te devoro"


(Rosa Artigas, eleita já pela redação nossa correspondente em Sampa vem abrilhantar nosso blogue com uma bela crônica que escreveu em 2005, mas que permanece atualíssima.)
***
São Paulo nasceu de caminhos. Caminhos de índios, de tropa, de ferro, de asfalto feitos para chegar e partir. A cidade cresceu, se agigantou com gente que não veio para ficar. Formou-se como morada provisória de milhares e milhões de nômades urbanos, cujo futuro estava fora daqui: enricar e retornar às origens, ir para o campo, buscar o mar, desatravessar o oceano, ser cidadão em outro lugar. Como a estada se pretendia curta, tornou-se provisória a cidade. O tempo e o espaço submergiram num presente perpétuo, sem raízes no passado, nem projetos de futuro.
Como nada em São Paulo parece ter permanência, o novo submete o velho sem lhe deixar testemunho e insiste na rapidez imposta pelo ritmo alucinante da cidade que não pode parar. É certo que alguns restos arqueológicos, às vezes, são postos em redomas como exemplos exóticos de um tempo que escorreu entre os dedos: um palacete aqui, algumas árvores ali, uma reserva de mata, uma tribo de índios, ruínas, entulhos, cacos de vidro. O que predomina, todavia, são os edifícios, as avenidas, as ruas, os espaços que continuam sendo construídos, indefinidamente, sobre paisagens ignotas. Os rios são tampados e transformados em galerias de esgoto subterrâneo com largas avenidas por cima. Espigões são agigantados por edifícios descomunais, as encostas destroçadas, várzeas ressecadas, terrenos esvaziados. Espaços são ganhos dos charcos e meandros dos ribeirões para se transformarem em bairros de luxo, em áreas de ocupação miserável, terminais de ônibus, conjuntos de casinhas tristes, zonas de meretrício.
A cidade é a morada temporária dos pobres nas favelas, nos cortiços precários, nas invasões e nas ruas, sob os viadutos e as pontes. É também o lugar de estadia passageira dos ricos que, um dia, irão viver no campo falsificado dos condomínios privados ou nas coberturas ecléticas de aço e vidro das Miamis dos sonhos pequenos burgueses. No entanto, por paradoxo, São Paulo se torna irremediavelmente definitiva na vida de seus habitantes, mesmo que milhões de pessoas se recusem a deitar aqui suas raízes e a se reconhecerem no tempo e no espaço.
Ah! Paulicéia Desvairada! Como fazer com que o futuro seja construído aqui, neste lugar, não como fatalidade, mas como desejo coletivo? Como vencer a incerteza do presente e a nostalgia insignificante do passado nessa cidade que acolhe e expulsa, inclui e exclui, seduz e afasta?
Talvez seja preciso encarar de uma vez essa esfinge urbana antropófaga para decifrar esse enigma do tempo paulistano. O desvendamento desse mistério tornará possível, quem sabe, que as novas gerações transformem o acaso em intenção e, então, possam compartilhar da lembrança de um parque de diversões na Mooca ou brincar de piratas no Tietê, estranho rio às avessas que nos afasta do mar. Pode ser que consigam ouvir músicas, aprender as danças das tribos urbanas, diferenciar as formas novas das antigas, conhecer um semeador de idéias e alguém com alguma memória. Andar de ônibus, freqüentar um bar, passear num mercado, ler livros, ver uns filmes, fazer amigos. Lembrar de cor de uma praça, dum jardim, uma fábrica, de alguns poemas, dum colégio e daquele edifício que tem as curvas da mulher amada. Daí, desenhar o futuro, escrever uma história, contar histórias, fazer a história.
Rosa Artigas é paulistana e historiadora.

Enquanto meu Site não sai...Ilustra s/ Cachorro Louco II


Nanquim preto e guache branco sobre papel Schoeller - efeito de jato d'água de torneira sobre a superfície "entintada"- esta técnica é chamada de "xilogravura de paulista".

20.5.08

O Sujinho


(Continuação da Viagem ao maior engarrafamento do século)
Antes de sair do sebo subterrâneo "Via Libris" joguei minha mala e minha mochila no chão e passei os olhos pelo edifício caótico de livros e textos colados nas prateleiras e acabei encontrando um outro livro que persigo faz uma década, trata-se do livro "O Todo- Ouvidos - Cinqüenta caracteres de Elias Canetti. O livro permanecia quietinho dentro de um plástico com uma etiqueta onde estava escrito : "Esgotadaço" . Nada mais paulista! Só "balada" e "xaveco" podem competir com "esgotadaço". Meus amigos da terra de Mário de Andrade vão me criticar por estas generalizações e por ser tão ingrato com a cidade que me serviu de berço e me viu crescer para depois fugir feito um exilado. Quandi vi o livro de Canetti ali dando sopa, por um preço "salgadaço", pedi um desconto. O rapaz da livraria disse que o livro pertencia a um outro cidadão (não podemos esquecer que é um coletivo de livreiros) e que eu deveria passar ali no dia seguinte para ver se ele me vendia por um preço menor. Ele me disse gentilmente que achava que o dono do livro ia me dar esse desconto. Deixei meu nome, fiz a reserva e parti para casa dos meus amigos que iriam generosamente me hospedar. Eles tinham um jantar marcado e eu precisava urgentemente de um bife a cavalo. Uma explicação se faz necessária: não costumo comer nada pesado durante viagens. As paradas dos ônibus que fazem o trajeto Rio- São Paulo abrigam praças de alimentação muito pesadas (não é por acaso que a comida é a quilo). Não consigo entender as pessoas que fazem aqueles pratões de bandejão e depois conseguem digerir tranqüilamente sentados mais de 3 horas sem poder caminhar, esticar o esqueleto, trancados dentro dos ônibus.
Bem, seguindo a orientação de meus caros amigos fui para o "Sujinho", que antigamente era chamado graciosamente de "Bar das Putas", alí na esquina da Maceió com a Consolação. Lá eles servem uma bisteca que é o fino da bossa. Estava com o apetite de um retirante, mas me furtei de comer o prato principal, seria como ter um tijolo atirado no terreno escorregadio do meu estômago já tão maltratado pela fome da Dutra. Pedi um frango com legumes e arroz de brócolis.
Sem sacanagem, os caras humilharam a cozinha carioca, mandaram um prato sensacional (saborosíssimo!) que dava para alimentar um batalhão. E confesso que comi tudo, e pensei na sobremesa. Meu delicado estômago nem chiou, aceitou tudo numa boa e agradeceu. Enquanto jantava fiquei a observar um casal que da terceira idade que esperva chegar o seu pedido. O que me impressionou foi que eles não trocaram nenhuma palavra durante um longo período . Aí chegou um banquete e eles partiram para dentro dele conservando o mutismo de antes... Um velho casamento que já não necessita mais de comunicação? Talvez, já vi muitos casais jovens assim. Quem sabe, eles estavam com uma baita fome e irritados, sabiam que poderiam não ser gentís um com o outro ...palavras, afinal, para que existem as palavras? - Nós viemos aqui para comer ou para conversar? Casado não conversa mais.. Amante já vai no objetivo sem mais mais mais. Quem conversa é namorado...Deixemos de lado as especulações conjugais e vamos voltar ao que interessa.
O "Sujinho" tem um detalhe que vale a pena conferir. Como decoração , no fundo do restaurante existe uma foto P&B ampliada da Avenida Angélica dos anos 40 que toma toda a parede. É uma bela foto. Nela aparecem uma carroça que segue pelo meio da avenida com árvores nas suas calçadas e um casal espera para atravessar e lá de baixo vem um automóvel , um fordeco, um calhambeque para Roberto Carlos nenhum botar defeito; tudo envolvido numa névoa, ou seria uma garoa? Fotos antigas me levam para longe... Saibam que eu peguei bonde que passava na Angélica, vinha pela São João, e saltava quando ele dobrava a praça e ficava em frente à Escola Técnica de Química Industrial Oswaldo Cruz...tempos bons , meu avô foi motorneiro de bonde.
Saí do "Sujinho" com medo de perder o meu livro do Canetti e então voltei ao sebo e falei com um sujeito fantástico que fica lá curtindo um som e lendo seu livro na maior . O nome dele é Cyrus, e ele foi muito gentil também, localizou o exemplar e eu feliz feito Jamelão em dia de desfile cantei Aleluias pela Consolação com meu Canetti "esgotadaço" debaixo do braço tremendo de frio. O livro é um ensaio ficcional, na verdade um exercício de esboçar tipos (caracteres), resumos de pessoas. Falarei dele brevemente( tradução de Herbert Caro que foi amigo de Canetti e sempre faz mais do que uma tradução- ele recria a linguagem do grande pensador - a capa é de Claudio Mesquita - acho que ele fez com lápis de cor aquarelado) . Enquanto seo Canetti não vem, deixe-me curtir a Consolação e suas pizzarias Blade Runner...-Respire o ar gélido, repórter!... (Amanhã ou depois eu conto mais sobre a cidade e o tempo em que eu ia tomar café no Aeroporto, Bye, Bye)

Um Brinde: Uma Novo Cartum de João Zero

Enquanto meu Site não sai... Caricaturas de vários personagens


Da esquerda para a direita: (em cima)- Euclydes da Cunha, Marx e Manuel Bandeira.
(Embaixo)- Gilberto Freyre, Sartre e Samuel Beckett

18.5.08

Homenagem a Zélia Gattai - II - Caricatura de Jorge Amado

Homenagem a Zélia Gattai


Este é o esboço de uma caricatura que fiz para uma revista, o original ficou na redação dela e como não tinha computador nessa época fiquei apenas com o esboço feito a lápis.
Acima publico uma caricatura de Jorge Amado, assim os dois ficam juntos aqui nesse espaço virtual.

Enquanto meu Site não sai... Ilustração Médicos


Nanquim sobre sulfite, muito depois de Rembrandt.

16.5.08

Crônica da Tinê - Incomunicabilidade


Descartei o título "Quiproquó". Podia ser cocoricó, o galo não tem saudade da galinha carijó. O canto espantaria os que afirmam algo sem saberem ao certo de onde o galo cantou, para quem e porquê. Galinha que cisca distraída no quintal corre o risco de ir parar na panela do vizinho. Agora é uma tímida cata-milho, de repente, desenxabida que só 'cê vendo!

Talvez seja melhor botar ali no início "O prefixo DES". Desencontro, desentendimento, desconexão, descontinuidade - tudo isto aconteceu comigo nestas duas últimas semanas e, desconfio, não fosse a decisão em dar os casos por encerrados, ainda estaria a processar desculpas para não descambar em desafetos, mesmo ciente de que serei acusada de ser descortês com alguns. Pensar que tudo começou com a festa de um (que para mim não houve) e acabou numa citação poética de outro (que entenderam errado).

Quando não sei ao certo como agir, paro com aquela cara de colegial em prova de múltipla escolha - elimino o máximo possível as opções plausíveis de erro, até restarem duas para chutar uma. Pimba, quase. Na trave. É intrigante como a gente, quando em dúvida sobre o certo e o errado, sempre dá a resposta errada. Lei de Murphy.

Vou recomeçar. “Cacarejos”. Enviei receita de galinha ao "falso molho pardo" para uma conhecida no Piauí, com cópia para outras duas conhecidas entre Espírito Santo e Minas. Uma do Rio recebeu o texto encaminhado por uma das três e me cobrou ter esquecido dela, até no dia das mães. Enquanto respondia que ela, a carioca, detestava cozinhar, a piauiense respondeu que preferia fazer capote cozido e tomar a cerveja bem gelada. Retornei-lhe: capote, para mim, é galinha-d’angola, além de ter horror a molho pardo verdadeiro... fui interrompida pela capixaba que me corrigia sobre o autor de uma citação que fiz no meio da receita - pausei para verificar e confirmei que eu estava certa, o verso era de João das Pombas. Como prova, enviei o poema inteiro. Retornava à cervejada em Teresina quando a mineira, anfitriã da tal festa (que para mim não houve), perguntava em letras garrafais: "O que aconteceu? Você sumiu!" Ainda chorosa por ter perdido o churrasco, em que entrei numa de que tinham esquecido de mim, expliquei-lhe apressada que o combinado foi mal interpretado pelas partes, e sobre o desejo de ter outra oportunidade. A cerveja virtual começava a chocar no desquitópi quando a capixaba, impaciente, vem com "O que pombas têm a ver com galinha?” – PIM! nova mensagem: uma prima em Cerrito escreve “Eu também quero!” - e a carioca avisa que o meu telefone é fantasma de ópera: só atende uma secretária-eletro-barítono do tipo "Oi, tô nem aííí..." Volta a comadre mineira amuada a rebater "Agora, Inês é morta, pois todos já part..." quando a linha caiu.

Receita, galinha, pomba, poema, churrasco, hora, porta fechada, bronca. Depois deletei tudo para evitar tréplicas. Abro nova mensagem. Assunto: Dum spiro, spero. "Enquanto respiro, espero, como diziam os romanos” , reclama um tio latinista no Rio, por fora dos assuntos acima. Num latim furreca de caixa de fósforos, respondo: Lettera scriptum manet (que me desculpem se escrevi errado, mas o escrito permanece).

Não é ruim ser um pouco distante. Um tanto surda, sim. O problema está na leitura das coisas, ou na precária sintonia entre os seres. Muitas são as pontes. Corações chamuscados à parte, eu prefiro frango ‘à cubana’. Com cerveja de verdade ao cair o sol no silêncio dos montes.

Tinê Soares – 13/5/2008

15.5.08

Meus encontros e desencontros com "O Primo Basílio"


(Continuação da Viagem ao maior engarrafamento do Século)
Respira repórter!...O metrô sufocante me leva ao Paraíso (não se impressionem, é apenas o nome de uma estação). Ali eu faço uma baldeação (conexão com balde?) para a linha que me levará até a Estação da Consolação.( é muito "ão" na terra do Minhocão). Lá pego uma escada rolante - afinal para onde eu caminho, cadê a rua Augusta, e a direção Centro? Onde é a avenida Consolação? Sei que alí ninguém consola ninguém, e essa história de consolo é conversa de viúva, mas me encontro no frio da Paulista, gente pra caramba, a noite se aproximando e eu com uma fome de anteontem . Quando entro na passagem subterrãnea que atravessa a Consolação (perto do Cine Belas Artes e do antigo Bar Riviera - hoje fechado, no qual se encontravam os personagens da recente minissérie da Globo -" Amigos " da Maria Adelaidade Amaral)...Bem, quando entrei na passagem subterrânea que abriga um sebo coletivo denominado "Via Libris" encontro logo de cara , olhando para mim o livro "O Primo Basílio" de Eça de Queirós editado pela Ática no final dos anos 70.Fiquei emocionado, acontece que a capa deste livro foi feita por mim e eu tinha perdido o meu exemplar faz muitos anos. Na verdade numa série de encontros e desencontros.( A capa está aí do lado como ilustração desta croniqueta) Explico melhor, no ano de 1976 eu estava engatinhando na profissão de ilustrador quando encontrei a figura iluminada de Jiro Takahashi que viu meu porta-fólio no qual juntava nessa ocasião alguns artigos ilustrados do jornal Movimento e uns outros que havia publicado no Jornal da Tarde, umas HQs e ilustrações coloridas que eu tinha feito só para mostrar para editores a procura de trabalho. Jiro confiou em mim, e me passou esse livro do Eça para fazer a capa e o material didático que o acompanhava ( Uma história em quadrinhos apresentando os principais momentos do livro para conferir e orientar a leitura dos alunos - o livro servia como apoio para professores de literatura). Foi meu primeiro desafio com ilustração de capa. Trabalhei com colagem e o desenho foi feito com lápis de cor , aquarela e guache.
Para fazer a HQ do material didático usei um episcópio que existia numa grande editora de Sampa que foi muito gentil em me permitir o uso desse instrumento ótico. (Nessa época o episcópio e o aerógrafo estavam na moda).
Trabalhei duro, meu filho estava para nascer, a mãe dele e eu vivíamos numa dureza danada e estávamos aprontando as malas para mudar para o Rio, coisa que aconteceu quando encontrei um amigo, o John, que é descendente de chilenos e americanos e me indicou para trabalhar no estúdio de um ilustrador famoso de histórias infantís que tinha um escritório no Rio Comprido. Não fiquei muito tempo nesse estúdio, sabe como é o cara era italiano e eu como dá para ver pelo sobrenome também tenho ligações com o país que tem o formato de uma bota. É tutto buona gente, porém a coisa não deu certo. Mas esta é outra história. O que importa é que terminei o livro no Rio enquanto esperava que acontecesse algo de positivo na minha vida. E de fato aconteceu, consegui trabalho num grande jornal carioca, fui contrado para ilustrar um suplemento em forma de tablóide que na época se chamou "Serviço Completo". Passei ilustrar também o caderno de "Livros" e uma revista dominical.. e assim passei perto de 30 anos pintando o 7 , inclusive escrevendo textos neste antigo habitante da avenida Brasil.
Acontece que nesse interim acabei perdendo o meu "O Primo Basílio".
Muito tempo depois um amigo do departamento de arte achou numa livraria da Rodoviária um exemplar do livro e quando viu o meu nome na página dos créditos comprou e me deu de presente.
Corta/ Passa para o departamento de criação de uma agência de publicidade, onde uns sujeitos me entrevistam, e meu porta-fólio já era maior e incluia dentro dele o livro que meu amigo tinha encontrado na Rodoviária . Eu pensava que eles queriam contratar meus serviços de ilustração e eles "raposamente" me sondavam a respeito de um cliente que eu tinha- um curso de inglês para o qual eu fazia trabalhos numa espécie de escambo: - eu desenhava as peças publicitárias do curso em troca de aulas da língua praticada na grande Albion. Muita conversa mole depois, o pessoal da agência viu meus trabalhos e me descartou (ainda não se falava deletou) com aquele papo de que a gente te liga etc e tal...Acabei esquecendo meu livro lá, mas só percebi muito tempo depois e nem me lembro se telefonei para perguntar se alguém de lá tinha ficado com ele.
Desde este dia sempre andei a procura dele nas "feirinhas de livros" ou sebos que costumo frequentar e nunca mais o encontrei . Precisei passar pelo maior engarrafamento do mundo para achá-lo alí, na passagem subterrânea da Consolação. "O Primo" se encontrava em bom estado, mas sem o material didático que o acompanhava, decerto foi usado e virou poeira...Comprei na hora e fui correndo para a casa de meus caros amigos que me hospedaram nos dias em que passei pela cidade que me permitiu encontrar a minha primeira capa...(outras surpresas me esperavam na terra de Borba Gato)

Enquanto meu Site não sai... Ilustra sem título

13.5.08

Viagem ao engarrafamento do século


Cheguei ao Rio ontem de tarde, depois de uma desagradável passagem pela via Dutra a bordo de um ônibus onde arranjei lugar ao lado de um banheiro que foi se tornando fétido com o passar das horas e bafejava seu cheiro dos infernos a cada usuário que se arriscava a entrar naquele cubículo. Se você não quer ver, você bota uma venda nos olhos, uns óculos escuros, se não quer ouvir, bota uma rolha na orelha, ou um I-Pod, mas nariz não tem proteção. Você precisa respirar... Para piorar as condições ambientais, tive que aturar o som de um radinho que só tocava o batidão do créu e passageiros que insistiam em se desequilibrar quando passavam pela minha cadeira e me acordavam quando estava no melhor do sono que consegui mergulhar nessa encrenca. Minha fuga da hiper-realidade não deu certo. O "créu" me pareceu uma metáfora da situação a que eu e mais outros reféns estávamos metidos, ou melhor, sub-metidos. Voltava de Sampa, onde curti o dia das mães ao lado da minha que me deu muitos conselhos úteis e contou um pouco da sua história que guardarei para sempre na minha memória se Dr. Al Zheimer deixar, é claro!
Já disse a respeito de outras coisas que não como no prato em que cuspi. São Paulo está entre essas "coisas". Nasci lá, por acaso no bairro da Mooca. Minha mãe visitava uma tia minha que morava lá perto quando a cegonha chegou.Tenho parentes e amigos muito queridos que moram em Sampa , mas a cidade, não gosta de mim, tanto é que cheguei justamente no dia em que a megalópole enfrentou o maior engarrafamento da sua história (até aquela data, ou seja, a sexta-feira da semana passada- pode ser que se supere nos próximos dias).
O clima da rodoviária era , para variar, muito frio, digamos, gelado e a atmosfera perto das 17 horas da tarde, cinzenta, poluída e sombria. A marginal do Tietê parecia um rio de chumbo com faíscas dos milhões de faróis que iluminavam o triste caminho de volta para casa dos seus sofridos cidadãos que não merecem esse tratamento. O metrô estava cheio, quente, os vagões não tem ar-condicionado só uma ventilação que se concentra numas bocas no teto...:- Respire repóter! Você chegou na terra dos Bandeirantes...
Hoje vamos ficar por aqui, a cidade me reservava outras surpresas das quais falarei em outros posts.
(Até lá...)

68 é Hoje na Travessa - Ipanema


Você quer saber o que aconteceu em 68, entender esse ano maluco? Quer conhecer dois jornalistas do balacobaco que por acaso são autores de um livro sobre o tema? Então corra para a Livraria da Travessa , na rua Visconde de Pirajá, 572 pois lá meus queridos amigos Regina Zappa e Ernesto Soto estarão lançando o livro 1968 Eles só queriam mudar o mundo ( Jorge Zahar Editor - título muito feliz por sinal). Então, estamos combinados, hoje dia 13 de maio - terça-feira a partir das 20 horas na Livraria da Travessa na rua Visconde de Pirajá 572 em Ipanema . Todos lá!

10.5.08

Fragmento do dia - Francastel e função da arte

"Na vida das sociedades, o papel da arte é fornecer aos homens os meios de se subtrairem às regras rígidas da palavra e da lei, dos deuses e dos homens, e tornarem o seu mundo um pouco mais humano"
(Pierre Francastel em A Imagem, a Visão e a Imaginação- Edições 70 - Portugal - Tradução de Fernando Caetano)
Nota da Redação: Por questões técnicas e sentimentais, hoje não tem imagem: nem cartum, nem ilustração, nem caricatura. Só um fragmento do Francastel que já é muita coisa...

9.5.08

Enquanto meu Site não sai...Ilustra s/ Censura


Lápis de cor, aquarela e ecoline sobre papel Canson

8.5.08

Mais um brinde: Um cartum de João Zero

Crônica da Tinê - Ó mãinha, ó...


Em tempos de avatares de jogos virtuais, uma Barbie anoréxica foi clonada, gestada por uma barriga contratada, é criada por um casal de parceiros do mesmo sexo – a mãe, quem é?

No colégio tivemos aulas de puericultura. Aprendemos a trocar fraldas, dar banho, bordar o nome do ‘baby-doll’ - o meu era um menino em tamanho natural por mim batizado de Zé Paulo, até hoje não sei de onde tirei o nome para o boneco americano que ganhara. Cantávamos 'berceuses', preparávamos chá com bolo no meio da tarde para minhas “filhas” que representavam idades diferentes - Líliam, a mais velha, Lígia, a do meio, Gracinha, a caçula - e para as “filhas” das colegas, minhas “sobrinhas”: reuníamos nossas bonecas como um prenúncio de nossas obrigações futuras para irmos nos acostumando com a dignificante tarefa que nos aguardava – de acordo com o roteiro escrito pelos mais velhos - , inclusive o exercício das vaidades maternas, sem ao menos sermos consultadas se não preferíamos jogar queimada e depois de crescidas sermos corretoras na Bolsa, alpinistas ou velejar mundo afora sem data para voltar.
--- A minha Mademoiselle tem sapatos de verniz e um chapéu de ráfia branca com fita azul... é uma mocinha!
--- A minha Pierina tem olhos escalafobéticos (isto é, olhos em diorama), é mais moderna que a sua Pedrita das cavernas!
--- A minha Anuka é polonesa, tem cabelos pretos e caixinha de música dentro da barriga...
--- O meu Zé Paulo é um mijão!

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Existe teste vocacional para ser mãe? Algum cadastro obrigatório que autorize uma mulher a parir e criar filhos? As que não preenchessem os requisitos, receberiam treinamento ou seriam esterilizadas? Instinto maternal é mito? Ser mãe implica em sacrificar-se com doce abnegação ou... sacrificar os filhos ainda nos cueiros ao atravessar um túnel poluído para deixá-los na creche antes de ir para o escritório - os tais filhos de chocadeira? Pior: largá-los por aí, explorá-los, vendê-los, quando não devolvê-los por vias inomináveis ao Supremo...
A vovó da roça teve dezesseis filhos vivos, em que os mais velhos cuidaram dos mais novos, e pelo menos umas quatro "tias agregadas" serviram de babás. A vovó da cidade grande foi operária de fábrica, teve três filhos, nenhuma babá, ainda ajudou a criar netos e bisnetos - que eu saiba, suas bonecas foram de carne e osso porque aos oito anos teve que cuidar das irmãs Mariquinha e Julinha sem nunca ter recebido aula na ‘pueri domus’.

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Essa idéia aromatizada com rosas sobre enlevos maternais surgiu no período do Romantismo, ao som de baladas em meio a cromos de roliços nenéns em postais feitos à mão. Antes, filho era uma simples consequência biológica, encarado como uma obrigação: dar continuidade à linhagem, formar novas alianças, fornecer braços para trabalhar a terra e soldados para guerrear. Ainda no século 19 era de mal-gosto uma mulher amamentar o próprio filho, uma prática comum da classe baixa que fornecia as amas-secas.
Alguns aconselham a mulher a ter filho para ter alguém que cuide dela na velhice, ou seja, filho é um investimento futuro. Simone de Beauvoir foi taxativa: a maternidade é um direito opcional, eletivo. Portanto, se uma mulher não teve filhos porque não quis, nunca poderá ser julgada como sendo incompleta e infeliz. O poeta Vinícius de Moraes já dizia "Filhos, melhor não tê-los. Mas se não tê-los, como sabê-los?"
Tinê Soares – Maio2008

Enquanto meu Site não sai... Ilustra Amor Arábico


Lápis sobre papel sulfite

7.5.08

Socuerro!

Como é que eu faço para me livrar destas estrelinhas ridículas e esta coisa de ratings?
Por favor me ajudem a limpar este blogue destas tralhas!
Obrigado, Thanks, Gracias,e vai por aí...

Enquanto meu Site não sai...Ilustra s/Maranhão entre o Reggae e o Bumba meu Boi


Traço de Nanquim sobre papel sulfite com efeitos de Photoshop

6.5.08

Revista de Teatro do SBAT volta com tudo


A Sociedade Brasileira dos Autores Teatrais (SBAT)relança sua Revista de Teatro no dia 12 de Maio às 21 horas no Restaurante La Fiorentina que tem em suas paredes assinaturas e fotos dos maiores atores que pisaram nos palcos deste país. Na ocasião rola uma apresentação do projeto de recuperação e digitalização do acervo do SBAT de 1917 a 2007. É necessária a apresentação de convite para entrar. O legal é que agora existe uma revista que trata desta nobre arte. Viva o Teatro!

Enquanto meu Site não sai...Ilustra: Cachorro louco


Lápis de cor e econline sobre papel Canson

5.5.08

Enquanto meu Site não sai...Ilustra de Quixote e Sancho Pança


Lápis sobre sulfite / Efeitos de Photoshop

4.5.08

Enquanto meu Site não sai... Ilustra sobre Jazz


Lápis de cor, Ecoline sobre papel Schoeller / efeitos de spray Crylover (é assim que se escreve?)

3.5.08

Crônica da Tinê: Xica da Silva reciclada


Todo dia ela faz tudo sempre igual, me sacode às seis horas da manhã, me sorri um sorriso pontual e me beija com a boca de hortelã.”

Assim começa a canção sobre o cotidiano de um trabalhador. Uma visão masculina do homem que ao fim da jornada tem uma mulher em casa à sua espera no portão. E quando ela cansa de esperar? Há cantiga de consolo ou ela troca de portão?

Altiva, sem pompa. Corpo forte, pele escura, touca de meia na cabeça e disposição de ferro, assim é a mulher que vejo no meio-fio revirando o lixo ou puxando a carroça de duas rodas sem burro, ela é a própria tração. Animal!

Com método de pesquisador, ela separa o refugo. Papel, alumínio, plástico aos montes, já que, por razões que desconheço, ela não pode separar os alhos dos bugalhos de sua vida que a tornaram o "homem" da casa.

Sim, todo dia ela faz quase sempre igual. A variação fica por conta dos achados e do trajeto percorrido até chegar à balança na praça no outro lado da cidade para pesar e anotar em seu cartão a féria do dia.

Um prato de canjica, um gole de café. O garimpo desta mineira começa cedo. Tem supermercado que junta material num canto para ela. Tem rua de morador festeiro onde ela é rápida em se apossar das latinhas - metal vale quanto pesa, é uma sorte danada encher o balaio somente com festa.

Ao contrário de outros companheiros na mesma lida, ela não é de fiar conversa, fareja no ar qual loja renovou estoque e descartou o lixão bom. A busca é todo santo dia.

Em dias e horas diferentes nossos caminhos se cruzavam, passei a cumprimentá-la. No início ela me olhava de soslaio. Um dia disfarcei, fui clicando bueiros até parar diante dela, perguntei-lhe o nome. Deixou-se fotografar. Não me fez perguntas. Então não lhe perguntei mais nada. Só prometi cópia da foto. Ela sorriu, apoiou a alça da carroça nos ombros e se pôs em marcha.

Aos domingos ela deve sentar na soleira da porta para descansar quando o corpo se abandona mas o olho por conta própria vasculha a área por uma lata, um frasco, coisa pouca, pois sua vizinhança tem lixo magro como o filho ou neto que corre feliz pela rua atrás da bola murcha. Ela não deixa a bola furar.

Ela não sonha ao meio-dia enquanto engole a bóia fria. Ela não é ácida como hortelã nem amarga como café. Ela não espera ninguém especial além da própria janta.

Pensar na vida é se lembrar de ir a tal lugar no dia seguinte e torcer para não chover. Pensamento sério, apenas a gratidão ao Ser Divino por ter força nos pés em sandálias de borracha e nos braços nus que sustentam a carga como a canga no boi.

Dia desses, ela passará ligeira com sua carroça vazia de fim de tarde carregando uma caixa bonita. Um rastro perfumado anunciará que, além de ser o arrimo da família, a papeleira também é a mulher que gosta de ganhar sabonetes pelo dia das mães, da avó, da mulher, do trabalhador...

Tinê Soares – [29/4/2008 - 17:37:51]
NR: A foto também é da Tinê .
O Editor aproveita a oportunidade para pedir desculpas públicas, pois cochilou no dia do trabalho e só postou esta bela crônica hoje.

SENAC em Revista


Acabo de receber o Boletim Técnico do SENAC cuja ilustração de capa foi feita por este blogueiro que vos fala.
O BTS tem como conteúdo artigos sobre educação profissional. Neste número figuram artigos tais como: Novas (Faltas de) Oportunidades: Chances e Angústias Virtuais (tema da capa) / Competências Socioambientais: Pesquisa, ensino , práxis / A Experiência das Career Academies nos EUA / Turismo Solidário e a Valorização da Mulher / A Prática Vivenciada em Escolas Agrotécnicas Federais: Formação para Autonomia ou para Conformação? / TNI (Técnicas para Narrativas Interativas) e uma resenha do livro de Mike Rose "O Saber no trabalho - Valorização da Inteligência do Trabalhador" Ed. Senac -SP
As ilustras internas foram feitas por Aliedo, Calicut, Cavalcante, Luiz Agner, Nathalia Sá Cavalcante e Vilma Gomez.

OAB em Revista


A Revista OAB da 4ª Subeseção - MG de Abril de 2008 está circulando com bela capa de meu amigo Jorge Arbach. Conteúdo repleto de assuntos não só técnicos , mas também contemplando entre outros, temas quentes da nossa época conturbada, como terrorismo, discussão sobre endurecimento de penas, violência , desigualdade e literatura, reformas do código civil, direitos humanos...enfim leitura obrigatória para que haja cidadania no nosso país.
Ilustras internas de Jorge Arbach, Trimano, Mário Tarcitano (que também fez o projeto gráfico e a diagramação) e deste blogueiro que vos fala.

Enquanto meu Site não sai...Ilustra "Fotogramas"